terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Clareza

com ciência
não vejo a vida
que a consciência
a ver me convida

pois com ciência
a vida que vejo
é nada além de ensejo
que a consciência,
despida de ciência,
quando revida,
trucida

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Na vontade do Sol

Ventava. Era um dia qualquer do outono, o que em São Paulo não significa muita coisa. Em todo caso, as árvores estavam desfolhadas e, seu galhos, secos. Fazia frio na praça. O Sol, sempre um motivo de contemplação, se escondia. Não estava sociável, pra ninguém, salvo para as nuvens que faziam um belíssimo trabalho em ocultá-lo e ostentar a nós nada além de pequenas parcelas de raios. Só pra deixar na vontade.

Os desocupados que ocupavam a praça ocupavam-se também de se despreocupar. Tinham sacos coloridos de pipoca nas mãos, que tornavam tudo aquilo muito nostálgico e fazia do curso dos raios no céu cinza um lindo espetáculo (pelo menos um que merecesse uma pipoca). Em toda a extensão da praça, bitucas de cigarro e cangas com as pontas voando forravam a grama. Ventava, e o vento batia agressivo na pele. A maquiagem do céu continuava sendo o pequeno conjunto de raios escassos, num dia grisalho e com olheiras, sem vaidade ou rubor. O Sol descia e a maquiagem puxava de leve para os tons pastéis, mas ainda sem muita emoção. Cara-pálida esse céu.

Em meio à serenidade falsa na atmosfera, umas gargalhadas chegavam como numa invasão bastante agradável aos meus ouvidos. Aos olhos, aparecia no longe um sorriso sincero e, na pele, o vento era forte, ainda empenhado em cortá-la. Tudo isso era a felicidade de um homem lá longe, também grisalho e também com olheiras, como o céu, traduzida em sinestesia. O bem-estar na sua voz era uma metáfora pronta para invadir os sentidos alheios - e meus sentidos todos. Ele rolava pela grama dando motivos incessantes para que as gargalhadas de uma pequena menina se misturassem às dele e compusessem, sem querer, a sinfonia mais bonita que ouvi naquele dia. Com sete ou oito anos, a criança tinha pele branca e cabelos com todo o comprimento das costas. Ele usava calça jeans e camisa, embora não tivesse receio algum de sujar uma ou outra enquanto deitava e rolava de rir. Eram pai e filha, com certeza. Os dois riam do mesmo jeito, no mesmo timbre, no mesmo tom.

Passaram-se uns minutos assim e cessaram-se as gargalhadas. Ele agora falava sério com ela. Apontava, gesticulava, pedia com vigor. O que ele queria? Estava longe, eu não escutava. Estendeu a mão. Desconfiada, ela observou e hesitou. Ele insistia, repetia o movimento com a mão disponível e pedia ainda com mais insistência. O quê, não sabia dizer. Ela fez cara emburrada, deu finalmente a mão e, de nariz franzido, topou. O quê? Os dois andaram juntos e devagar em direção a uma corda bamba presa entre duas árvores, ele na frente. Depois de muito negociar, a menina presenteou o pai estendendo-lhe novamente a mão e, com uma ajuda, subiu na corda. Titubeou, levou um momento ou dois, e logo se equilibrou. O pai segurava os dedinhos e sorria um milímetro a mais a cada passo adiante na corda.

Imagino a pequena menina vinte anos no futuro. Sua memória afetiva certamente terá guardado o dia em que seu pai lhe forçou a andar na corda bamba do início ao fim. Ela terá virado uma ginasta olímpica, profissional de 'slackline', ou não. Fato é que ela se lembrará daquele dia pálido de outono, e de seu pai que sabia mais sobre sua capacidade do que ela própria aos nove anos de idade - e talvez ainda soubesse até hoje, duas décadas depois. Entenderá a força da ação e das gargalhadas do grisalho de jeans e camisa suja de terra, que naquele dia só precisou estender a mão algumas vezes. Perceberá que a confiança depositada por ele era maior que a que jamais tivera nesse tempo todo. Duvidará que vinte anos depois pudesse finalmente andar na corda bamba sem que lhe dessem as mãos, e então lembrará que o apoio do toque era caloroso, mas servia apenas de apoio, pois o passo a passo ela havia feito sozinha. Sorrirá então e, se tudo der certo, encontrará um meio de caminhar só, e de seguir caminhando sem o calor das mãos.

sábado, 19 de outubro de 2013

Flores de liz, colo de vó e a Rita Cadillac

Ela entrou ansiosa pelo aconchego eventual que quatro paredes - neste caso floridas - de um bar qualquer pudessem lhe proporcionar. 'Onze Graus Celsius' marcava o relógio da cidade, com sensação térmica de sete. Ou cinco. O asfalto era tão gelado quanto o contato dos dedos com o copo americano em seu mais glorioso estado: cheio. Pareceu-lhe conveniente e suficientemente brasileiro pedir um caldinho de feijão. Nada de harmonização, apenas goles quentes e gelados de sabores salgados e amargos, ou nostálgicos e terapêuticos (respectivamente, ou não). À mesa, o feijão e a cerveja, ambos em copo americano, cada um no seu.

Não fosse São Paulo, estranharia o mendigo na calçada se esquentando com a caixa de uma TV que deveria ter mais polegadas do que Hong Kong tem gente. Ele estava feliz, já que um menino de cabelo loiro conversava com ele tão proximamente quanto seu desapego social lhe permitia chegar. E digamos que ultimamente ele parecia empenhado no desapego - e o empenho crescia na mesma proporção da conta do bar. Ele olhava no olho do homem de rua, que aceitava o convite inebriado para se hospedar em sua casa. Enquanto isso, a moça que acompanhara o ariano politicamente correto até então olhava o céu e parecia ver ali a beleza que quem está bêbado e/ou entediado normalmente vê. Recentemente trocada pelos encantos desprendidos do nômade, decidiu-se por tentar fazer das meninas que fumavam ali umas amizades novas.

Papos metalinguísticos sobre a habilidade social empreendida pela necessidade do cigarro, do isqueiro e de afins não necessariamente lícitos desenrolaram-se para além do frio. E as risadas de inconformismo lúdico em direção ao menino loiro empenhado em salvar o mundo não cessaram até que um sanduíche chegasse à sua mesa, ele e seu recheio de frango, salada, catupiry e queijo amarelo. Clássico, porém vulgar. E indiscutivelmente apetitoso. Talvez por isso estivesse no cardápio sob o nome de 'Rita Cadillac'.

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Papo bom

São Paulo, Vila Madalena, balcão do Bar Salve Jorge, 14 de Outubro de 2013, 21h36. E o diálogo que se seguiu.

- Você gosta de Britney Spears?
- Ahn?
- É, você tá aí, sozinha, cantarolando.
- Ué, tá tocando a música.
- Eu sei. Mas você conhece.
- Conheço. Tocou no rádio.
- Mas você gosta?
- Ahn?
- De Britney. Você gosta?
- Por que você quer tanto saber se eu gosto de Britney Spears?
- Sei lá. Ué. Você é bonita, parece inteligente, mas tá aí sozinha cantando Britney Spears.
- Hum. Pois é.
- Por quê, hein?
- Por quê o quê?
- Por que você gosta de Britney Spears?
- Eu disse que eu gosto?
- Não.
- Então…
- Mas não disse que não gosta.
- Ai! Moço, você tá bêbado.
- (Risos). Eu não estou não, também tô na primeira capirinha.
- A minha é caipiroska.
- Ah...
- É...
- Então você gosta de Britney Spears e de vodka.
- (Risos). Que obsessão!
- (Risos). Desculpa.
- Tá desculpado. Mas sim, gosto de Britney Spears e de vodka. Não necessariamente nessa ordem.
- Há!
- Ahn?
- Sabia!
- É, mas acho que seu interrogatório me fez gostar mais ainda.
- Impossível. Não entendo o que se passa na cabeça das pessoas pra gostar disso. E nem de dono de bar assim pra tocar.
- Que revolta!
- Não é revolta. É só gosto.
- Esses cultos dos dias de hoje em dia, viu?
- Que culto? Precisa ser culto pra perceber que isso aí é uma merda?
- Viu? Revolta.
- (Risos). Pode ser. Mas você é muito inteligente pra ficar ouvindo essas coisas.
- Moço, me dá mais uma dessa? Mas pede pra fazer mais fraca dessa vez? Brigada. Muito inteligente? Você nem me conhece.
- Ué, mas dá pra ver.
- Dá pra ver que estou num nível acima da Britney?
- Dos fãs da Britney.
- Eu sou fã da Britney.
- Por quê, mano? A música é uma merda.
- Sei lá mano. Eu curto.
- Você curte música merda então? Já sei, cê deve ser fã do Los Hermanos.
- (Risos). O que tem a ver?
- Tudo merda.
- Ó, vossa excelência proclamadora das merdas musicais contemporâneas.
- Você fala bonito.
- Mas tenho mau gosto musical.
- Ninguém é perfeito.
- Meu defeito é ser fã da Britney?
- Ah… você tem as sobrancelhas meio tortas também.
- Oi??? Que tipo de homem repara nisso?
- Tem, não tem?
- Não o suficiente pra ser um defeito apontável, assim, num bar por um estranho.
- Tá bom, desculpa.
- Nem sei seu nome e você já pediu desculpas duas vezes.
- É mesmo. Que absurdo. E não sou nem eu que gosto de Britney Spears.
- Ahhhhh então eu tenho que me desculpar por gostar de Britney Spears?
- Só se você quiser.
- É… não quero.
- Deveria, a qualidade da música é uma merda.
- E por que apreciar uma pessoa só pela qualidade da música?
- Ah, e eu que sou o cult.
- Oi???
- Lá vêm as reflexões filosóficas. E eu que sou o cult!
- Claro que é! Eu que tô falando que gosto da música trash.
- Ah, então você admite que é trash.
- Ai, que saco! É trash e eu gosto.
- Nossa, como você é autêntica.
- Oi???
- Você é autêntica.
- E essa ironia desnecessária? Você é um intrometido que
- Hipster.
- Eu??? Você que se recusa a gostar de qualquer coisa que não seja Tulipa Ruiz ou Godard.
- Tulipa Ruiz? Não, brigada. Fico em casa ouvindo meu gato miar.
- (Risos). Pois eu fico em casa ouvindo Britney.
- Você ouve Britney em casa?
- Não, mas agora vou começar.
- Ai, hipster e do contra. Grande, manda mais uma aqui também, por favor.
- Caipirinha com cachaça é hipster.
- É nada, é clássica.
- Ai, então tá. Tchaikovsky e Godard.
- (Risos). Melhor que Britney Spears.
- Depende.
- Nunca depende!
- Ai, que prepotente você. Que que tem de tão errado com Britney Spears?
- A música é muito ruim, mano.
- E daí que é ruim, mano? Aposto que tem muito mais gente dançando Britney na balada do que Édith Piaf.
- Ah, vai me dizer que por isso Britney é melhor que Édith Piaf.
- Não.
- Ahn…
- Mas Piaf não é melhor que Britney.
- Ave! Alguém exorcisa a menina aqui.
- (Risos). Petulante. Tá falando pra me encher o saco.
- Não é possível. Eu? Você que tá falando pra me provocar!
- Ah… você que veio puxar assunto. Tava aqui no meu canto.
- No seu canto cantando hit me baby one more time.
- Ó lá. Sabe até a música.
- (Risos). Todo mundo sabe.
- Viu?
- Viu o que, criatura?
- Criatura é bom, hein. Viu, todo mundo sabe a música dela. Ruim não pode ser.
- Todo mundo sabe porque é ruim!
- E daí? Precisa ser boa? Para de ser close-minded.
- Ahhhhh "para de ser close-minded"! Como você é hipster.
- (Risos). Antes hipster do que pseudo-cult.
- Pf…
- Aiai…
- Agora é sério. Você jura que gosta de Britney Spears?
- Não, sério. O que tem se eu gostar? Ela é foda!
- Ela é foda? É uma vagabunda drogada, isso sim. Tem não sei quantos filhos e fica querendo se mostrar na TV.
- Uau, hein.
- Que???
- Sei lá, acho tosco quem pensa assim.
- Então vai, fala. Como você pensa?
- Eu não, parece que vai ser um sacrifício me ouvir.
- Por Deus.
- É, deve ser por ele mesmo.
- Ahn?
- Amém.
- Por que por
- Vocês e os seus valores.
- Que???
- (Risos). Tô meio alta já.
- Desembucha, criatura.
- Tá, mas só porque você pediu com jeitinho.
- (Risos). Desculpa.
- Eu só acho que ela nunca fez nada pra ser odiada.
- Exatamente, nunca fez nada de
- Ainda bem que eu que ia falar.
- (Risos). Desculpa.
- Eu só acho que ela tinha o estilo dela. Meio diferentosa, oferecida, queria dar pra vários caras e mostrar na TV a barriga chapada.
- É.
- E que que tem?
- E se fazia de santinha.
- Ah, marketing pessoal, meu bem. Você mesmo tá fazendo, ó. Barba mal feita, oclinhos de vô, "abomino Britney Spears"…
- Ahhh, tá bo
- Além do mais, no fundo no fundo ela não se fazia de santinha nada. Prenunciou tudo nas músicas dela que ia surtar.
- Ahhh, coitadinha.
- Pois é, coitada mesmo. Queria viver a vida dela do jeito dela e ficou o mundo inteiro enchendo o saco porque ela era maluca. Ficou maluca mesmo.
- Ah, mas ela ficou maluca porque o mundo encheu o saco ou o mundo encheu o saco porque ela era maluca?
- E o que tem ser malu
- Quem veio primeiro, o ovo ou a galinha?
- O homem. Depois vieram esses tabus ridículos que condenam todo mundo que quer ser um pouco mais out of the box.
- "Out of the box."
- Quê?
- Hi-ps-ter.
- Puta que pariu, você enche mesmo o saco.
- Eita. Sem educação.
- Hipster é você, que se acha um cultzinho por dizer que Britney é de má qualidade bla bla bla whiskas sachê, mas na verdade pensa pequeno.
- Penso pequeno. Tá bom.
- Aiai…
- Desculpa se não sou "open-minded" e se já é muito "mainstream" odiar a Britney.
- Não é questão de
- Ó. Esse programa aí é da hora.
- Que que é isso, Pânico na TV?
- É.
- Você reclama que tocam Britney Spears e curte ficar vendo mulher semi-nua e piada ruim na TV que nem com som está?
- Afe, que tem a ver?
- Nada não, deixa quieto.
- Essa mina é um espetáculo.
- Quem, Sabrina Sato?
- É. Barriguinha chapada...

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Dá um tempo

Surda-muda e voltada para os meus discursos interiores, não me restava senão o tempo. Partindo da conclusão estabelecida por Albert e sua teoria onipresente de que o tempo é relativo, sucumbi à intimidade que jamais desejara criar com ele - com o tempo. Nu e cru. Ou um tanto cozido pelos pensamentos, pela reflexão e pela surdez, assim como o peixe no limão. Parece cru, mas não é.

É cozido.

E é familiar. Metamorfoseado no que instantaneamente e depois se converte em memória, o tempo é tão disforme quanto concreto, e se apresenta da forma como queremos empreender nossos esforços ou recolher-nos à discrição. O tempo, portanto, não é cru. Ele é assado no trabalho, é grelhado no exercício, é frito na diversão e é cozido no vapor do sexo. O tempo nu e cru é a ausência de memória, e daí a impossibilidade inerente ao tempo de ser cru. Tudo é intoxicado de memórias - elas são o tempero do peixe.

O tempo é excruciante e inacabável a quem não o consome, apenas deixa que ele passe. As memórias não o camuflam e muito menos aceleram. A quem se atenta a cada pedaço dele, ele é tortura pura, é cozido, frito e duro de tão bem-passado. É uma sola de sapato, mas daquele que já andou pra muito longe e viu memória se esvair, saudade ascender e tempo passar.

É doído, é saudosista e é masoquista. Podia-se muito bem abrir mão da memória, passar o tempo cru e sem memória, ou até mesmo beber pra esquecer. Mas sem memória não tem tempo, e sem tempo não tem sofrimento. E que graça tem o tempo quando ele passa sem que tenha sofrimento? É leve e não se sente, é insustentável. Ninguém merece.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Não quero me posicionar. Será que tudo bem?

Estou com medo.

No exercício e no estudo da profissão jornalista, aprendemos a incorporar a prática de se tirar para fora (assim, no pleonasmo mesmo) de uma situação na tentativa de analisá-la. O objetivo é angariar uma percepção um tanto mais lúcida - ou imparcial para os utópicos - sobre o que vem acontecendo.
Bem, isso costuma dar certo. Eu, pelo menos, me sinto um tanto privilegiada por fazer parte de uma camada sócio-intelectual com capacidade e senso-crítico para conseguir formar opinião própria sempre que desejado ou necessário. Tenho certeza de que você, que me lê, também.

De repente vejo um borrão à frente. Está difícil entender o que é verdade, o que é sensacionalismo, o que é opinião adulterada por visões tendenciosas ou partidárias. Quanto mais tento discernir e categorizar cada fatia de informação que recebo e absorvo, percebo que todas elas - sim, até as "fascistas", como está rolando num texto bem divulgado ultimamente por aí - são legítimas. Ao mesmo tempo, todas se empenham em vestir uma realidade (que de fato não existe) com roupas e acessórios fabricados a partir de bagagem cultural, ideal político, criação familiar e - por que não? - posts alheios de facebook.

Dia desses comentei que as redes sociais vêm dando aula de comunicação na mídia tradicional, talvez por não estarem vinculadas às relações de poder que permeiam o desempenho dos veículos jornalísticos, talvez por funcionarem com base numa dinâmica parecida com o que inferimos de alguma disciplina da faculdade por "jornalismo colaborativo". Ao menos é mais fácil perceber esta semelhança do meu ponto de vista, que tem a cada scroll na timeline um bombardeio sem fim de percepções sobre o que vem acontecendo sobre os últimos fatos sociais - ainda na esteira do aprendizado acadêmico - que tomaram lugar na nossa sociedade.

Ah sim… a tal da sociedade. Alguém muito esperto dirá que a mesma não é nada além do reflexo de seus próprios cidadãos. Eu - não mais esperta que essa pessoa - direi que me lembro de ter lido uma notícia em 2010 dizendo que a audiência de algum paredão do Big Brother havia superado a de um debate presidencial veiculado por qualquer outra emissora que não a Globo, é claro. À parte discussões sobre as estratégias maquiavélicas plin-plins, um povo que hoje sai às ruas clamando por melhorias aqui e acolá deveria ter se atentado para o governante que ia estar à frente dessas questões enquanto ainda era tempo. Deveria. Mas não foi. E tudo bem, do meu ponto de vista isso é completamente perdoável. Eu não sou politizada desde a posição fetal - e até hoje, nos meus humildes e bem-vividos 21 anos de idade, não acho que 'mereça' a etiqueta. Então, na mais cliché das perguntas, pergunto: Quem sou eu para julgar o telespectador do BBB que sai às ruas no maior clamor desde os controversos 60? Mas num raciocínio que me parece mais justo, re-elaboro: Quem é você, que decidiu politizar-se ontem, para julgar quem decidiu politizar-se hoje?

O excesso de opinião e a absoluta necessidade de expressá-la vindo de todos os lados - direita, esquerda, cima e baixo, com destaque para a metáfora - me desespera. E isso não é de agora, esse tiro cruzado. É a mesma história de quando já neste ano o Chávez morreu, de quando a PM quis ocupar em 2011 o campus da USP e de quando Quem Quer Ser um Milionário ganhou o Oscar de 2009. Todas elas re-escritas. E vale compartilhar, tenho uma noção sobre os fatos de hoje infinitamente diferente do que tinha então (me chame de Jabor). Estamos saturados de informação, estamos fartos, cansados. Basta.

Mentira, é claro. Queremos é mais. Quanto mais, melhor, inclusive. "Mais embasamento terei para formular um raciocínio."

A reflexão acerca do que vem acontecendo é absolutamente necessária do meu ponto de vista, pois transcende idiossincrasias, partidarismos, concordâncias e discordâncias. Vai além. Chega ali, no imo do nosso papel como indivíduo nessa tal de sociedade. Acho que falta a alguns perceber que é importante exercitar essa reflexão, construir um senso crítico e entender aos poucos no que quer e não quer acreditar. Falta compreender que a manipulação e formação de opinião como poderes que a grande e sacra mídia detém são fatores a serem refletidos também (não apenas demonizados). E falta compreender que compartilhamentos e likes desembestados são nada além do reflexo zuckerbergiano da carência pela aprovação de opiniões quase sempre recicladas.

Acho que tecer qualquer tipo de conclusão agora seria o mesmo que riscar e anular cada palavra que redigi até aqui e simplesmente desperdiçar um espaço virtual livre de taxações (o que me parece raríssimo nas últimas semanas). Afinal de contas, não quero me posicionar. Ainda não sei o que penso a respeito de tudo isso, que é assustadoramente novo e diferente ao meu jovem par de olhos. Será que tudo bem?

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Se isso te consola

Se isso te consola, não precisamos mais trabalhar todos os dias. Não precisamos acordar cedo, pegar trânsito, ouvir buzina e ambulância. O que precisamos é ter certeza da nossa companhia, é descobrir um roteiro e mudar de circunstância. Vamos viajar, zarpar, navegar ou voar, mas não vamos mais visualizar qualquer futuro sem graça. Uma ideia que a gente abraça, um destino que a gente enlaça e aí é só escolher entre vodka ou cachaça.

Se isso te consola, não precisamos mais de tanto concreto. A gente busca outro teto, um discreto, mas completo. Precisamos de um roteiro caribenho, um cruzeiro porto-riquenho, fugir daqui e ir viver no Havaí. Pode ser pro Norte e achar muito açaí, ou qualquer praia com caipiroska de abacaxi.

Se isso te consola, vamos ter os pés enterrados na areia, fugir da terra da garoa, esquecer essa cidade feia e subir numa canoa. Chega de chuva, a caipiroska também pode ser de uva. Vista pro mar pro coração acalmar, com céu azul guiando a gente pra bem longe do sul.

Se isso te consola, vamos viver sem preocupação, sem confusão, sem decisão. Vamos cair na gandaia, enjoar de viver na praia. Vamos viver fora da gaiola olhando caiçara jogar bola.

Vamos viver de caipiroska enfeitada de carambola, se isso te consola.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Cola

Sem mais, pensava em lhe dizer adeus sem nem sequer pensar em correr mais um risco. Achara-se em pleno encantamento com a vida interior e particular, e agora perdia-se na desilusão de se encontrar refletida em outra face.

Sem mais, tentava encontrar qualquer razão que lhe desse razão para um fim. E era num refrão de repetidos nãos que se achava por fim de cara com um sim. Tentava encontrar razões e perdia-se na ausência da resposta que lhe ostentasse um motivo, ou um simples não. Ao invés, viu-se de frente a um muro de coragem, um muro anti-perspectiva ou preservação.

Sem mais, deitava-se em frente ao muro e via nada além do céu, que por falta de água refletia sua imagem. Por volta do muro, pensava uma saída, e ainda deitada, vislumbrava e sonhava um esquivo, a falta da decisão, um regresso passivo. No fim, excluía de uma história o personagem, que de tão ostensivo, e de tão agressivo, induzia corriqueira auto-sabotagem.

Sem mais, implorava por um espaço no peito, um espaço no colo, um espaço lascivo, uma hospedagem. Implorava um espaço na pele, fosse adesivo, fosse tatuagem.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Casablanca do avesso

Queria mesmo era ficar sentada naquela cadeira desconfortável, esperando o tempo passar e fingir que ainda dava tempo de desistir. Desceu do avião, afinal que outra opção tinha? Tudo branco. Se era a neve ou a vista daquilo tudo cegando seus olhos, não sabia. Era mais nada que tudo, na verdade: nada além de uma pista vazia de aeroporto. E ainda assim tanta coisa.

Choque térmico, como esperado. Tantas mudanças que uma simples troca de hemisfério exige sem que ela soubesse, então colocou seu cachecol, como que por respeito. A quem, também não sabia.

Se virou de um jeito ou de outro, deu alguns passos e olhares perdidos até cair no trem certo e conhecer o violinista certo que lhe daria a primeira boa impressão daquele lugar. Aliás, a primeira impressão de todas. Depois da neve cegante, não havia tempo para impressões - elas se apropriam demais e de forma muito intensa da mente.

Enfim, o violinista. Caricato grisalho fedendo a falta de banho, porém tão doce quanto suas notas vivaldianas. Sabia ler mapas, mas acabara não ajudando tanto quanto podia - ou se fazia mais inocente (na ausência de um adjetivo mais pejorativo) do que era. Sorriu e acenou com a cabeça apenas, interrompendo a melodia que suas cordas riscavam, sem abrir a boca pra soltar qualquer palavra que pudesse ajudar. Apenas sorriu.

Ela, mais uma vez, dera inúmeros olhares perdidos até conseguir se encontrar no espaço e no tempo e poder voltar a ter impressões.

Cruzes, que paisagem feia. Nada de campos idílicos, montanhas nevadas e rios refletindo o céu azul. Apenas casas semi-destruídas ou semi-construídas, mato sem poda, resquícios de vidas no chão e uma atmosfera simplesmente cinza. Já diria Caetano, "é que Narciso acha feio o que não é espelho" - pensou. Parou de pensar e começou a andar depois que desceu do metrô. Fazia frio.

A mochila pesava nas costas. Nariz e dedos das mãos, desprotegidos, se enrijeciam. Vou congelar, pensou mais uma vez. E mais uma vez, já não havia tempo para grandes impressões, já que o frio dessa vez era quem se apropriava de sua mente.

Quando atingiu o ponto de brincar consigo mesma, conformou-se num riso de canto com a morte por congelamento. Chegou então ao destino viva, claro, mas sem ainda se dar conta de que nevava - ou de que a luz branca mais uma vez cegava seus olhos e suas impressões.

Cinco degraus históricos, uma porta giratória e a recepção. Atrás do balcão, um moço com uma tatuagem, um sotaque e um sorriso disse poucas e simples palavras. Ela soltou sua bagagem ali mesmo e o fez rir quando perguntou, antes de qualquer coisa, onde era o cemitério.

O resto é história à la Bogart e Bergman, com a mais clichê das conclusões: "We'll always have Paris".

segunda-feira, 8 de abril de 2013

A penumbra de um trânsito caótico e o preço do tomate

Voltando pra casa do trabalho flagrei-me rindo em meio à neblina vermelha das oito horas da noite paulistana. O que deveria ser um momento de stress transformou-se numa pausa à realidade muito bem enfeitada com reflexões carinhosas a respeito do meu dia de labuta (incluindo nisso os malefícios inerentes ao lavoro) e, mais que isso, do dia anterior passado em branco. Por branco, peço que não interprete a falta de um presente físico, até porque o metafísico chegou - um pouco tarde, nos 45 do segundo tempo, mas só pra fazer jus à temporalidade tão única a este profissional homenageado no 7 de abril.

Minha reflexão começou quando ouvi na Rádio Jovem Pan alguma chamada do tipo "Cientista X admite que os estudos Y não proveram resultados concretos a respeito de Z". Aí me dei conta de quão infeliz havia sido a escolha da palavra "admite", já que o cientista absolutamente nada tinha a ver com a instituição que fomentara os estudos, e seu depoimento até então fora certamente um dos mais importantes e coerentes a respeito do assunto. Ainda assim, fora lapidado ao cientista a ideia de alguém que outrora mentira sobre estudos cruciais à humanidade, e admitia apenas agora seu erro na questão. Você vai dizer "claro que o raciocínio do ouvinte não foi tão longe" - talvez não num primeiro momento ou numa camada mais rasa do consciente, mas é incrível o poder que algumas palavras têm na formação de opinião. Inclusive, aí jaz uma das justificativas pelas quais nem mais me dou ao trabalho de responder ao corriqueiro "Jornalismo? Putz, e o diploma não vale mais nada, né?"

Lembrei-me então de um comentário virtual que fiz a respeito da morte do Chávez, de como me expressei mal e de como fui mal-interpretada. Nesse caso, eu estava no lugar da jornalista medíocre e incapaz de escolher palavras mais adequadas pra falar de um assunto tão polêmico (e, com exceção do falecimento do Chorão e do preço do tomate, não me lembro de ter visto assunto mais controverso que a morte do 'ditador fdp'/'deus na terra' - como queira). Minha intenção naquele momento era fazer um apelo aos desinformados de plantão que aproveitavam a ocasião para vomitar opiniões rasas a respeito de um tema complexo. Não que estivessem 'certas' ou 'erradas' - isto nunca nem foi ponto da minha crítica, até porque se fosse, contradiria a conclusão à qual quero chegar aqui - mas eram, em sua maioria, sem fundamento.

Não sou (anti)chavista e nem acho que precise adotar qualquer uma das duas posturas. Tento, assim, colocar-me fora dessa tão humana mania que é maniqueizar os assuntos e procurar, numa tentativa frustrada, defini-los todos em duas vertentes que se anulam, se compensam e se contrapõem. Como no caso do Chávez, do aborto, das drogas, do auxílio-reclusão, do Feliciano, da Margaret Thatcher, do capitalismo selvagem e da missão do ser humano no universo. Tento, num exercício diário, colocar-me fora desse tão humano hábito que é querer achar resposta pra tudo, colocar pingos nos is onde houver is, pintar de branco o que for de branco e deixar preto onde for de preto. Tento colorir os espaços com tons de cinza e fracasso quando critico o best-seller sem sequer ter lido. Tento, na mais frustrada das tentativas, entender por que o Chávez é ditador fdp E deus na terra ao mesmo tempo, e tento, sem obter o mais singelo dos sucessos, decidir se amo o capitalismo selvagem ou se me declaro com orgulho e louvor uma militante comunista. Tento, sem a menor credibilidade, explicar aos outros quão importante é estar informado antes de expressar opinião, ouvindo sempre a réplica irrefutável que defende a tão democrática liberdade de expressão.

Tento muito e não sucedo nunca. Depois tento achar uma resposta à dúvida: devo parar de tentar? Também fracasso. Fracasso em todas as tentativas e estampo um sorriso conformista típico do jornalista que tem noção de sua realidade, mas se contenta com a beleza imperfeita que ela lhe traz (pra não dizer as pautas que ela lhe traz). Feliz dia do Jornalista aos que já descobriram a inexistência de uma verdade - aos outros, fica aquele agradecimento do feirante pelo papel de embrulhar peixe.

terça-feira, 19 de março de 2013

Bitter

Ele se deita, se ajeita em seu leito e se afeita nos pensamentos
Recolhe-se coberto, bem perto, bem certo de todos seus feitos
Se enrola pra dentro, sereno, sedento por ares espertos
Amarra seu jeito, seu peito em rimas desertas

E então desenrola, rebola na dança da noite
Uma cantiga, uma amiga, sereia no açoite
Bem quente, ele sente um adeus de repente

E aquele repente, que nunca se atenta
Pra se descobrir num tão de repente
Como uma serpente, num tão deprimente
Olhar reclinante
Céu lacrimejante
Amor tolerante
E o adeus adiante

sexta-feira, 15 de março de 2013

Madrugada orgânica

Abriu as pálpebras, olhou o teto. Na hora, lembrança. Coçou os olhos num movimento proposital como que para apagar o pensamento que lhe envolvia tão cedo pela manhã. Que horas são? Abriu a cortina de tule pra ver o céu estrelado e se dar conta de que não precisava ter levantado. O relógio no criado-mudo marcava 4h30. Bom, já que estou de pé, vou fumar um cigarro. Sentou na varanda pra ver a neve derreter no chão da rua, o sereno enferrujar os postes em art-nouveau, ou qualquer outra imagem invisível aos olhos. O silêncio avassalador notívago deu volume à brasa do primeiro trago queimando. Adoro essa paz, pensou. A neve no chão, os passos solitários de um ninguém cheio de pensamentos ali, andando. Sozinho. É homem ou mulher? Não dava pra ver, estava encapuzado e debaixo de um guarda-chuva. Chove? Neva. Bom, é alguém. O que será que ele pensa ali, sozinho, andando? Aqui dentro nenhum som, ela dorme silenciosamente. O único ruído era do vento entrando poético através das cortinas de tule. E, de quando em quando, da brasa queimando. Na mesa de cabeceira, ao lado do relógio, uma garrafa e duas taças. Todas vazias, o copo d'água cheio.

O que estava pensando mesmo? A cena não lhe parecia conferir necessidade de estar presente em qualquer outro momento que não fosse aquele. Tudo estava perfeito, daquele jeito tão sereno. Tão afeito. Tanta paz em seu peito. Lembrou-se de mirar a neve, mas o encapuzado já tinha desaparecido. Na rua branca, apenas impressões de seu calçado pra lembrar alguém que um dia passara por lá. Mas quem lembraria, se nem eu lembro o que pensara agora há pouco? E ele, o que será que pensava?

Na convicção da imbecilidade que é precisar pensar, contentou-se em sentir. Num movimento quase orgânico, entrou, encaixou-se de volta embaixo do cobertor, deu um beijo na boca roxa adormecida e suspirou tranquilo, desejando em seu ego solidário que o encapuzado não estivesse pensando em nada. Nem mesmo na beleza que poderia ter a imagem visível da neve afogando os postes em art-nouveau.

quarta-feira, 13 de março de 2013

Glamour, Cultura e Prazeres: uma viagem à Provença

Segue um texto que escrevi sobre o turismo na região da Provence, no Sul da França. A proposta era produzir conteúdo para uma revista sobre vinhos, turismo e gastronomia.


"História, arquitetura, beleza, moda, arte, gastronomia, vinhos e cultura. Unir tudo isso significa pensar na França em sua mais pura e tradicional identidade. Quem busca a combinação de todos esses fatores, mas quer evitar o cenário urbano-caótico parisiense, deve pensar seriamente em fazer uma visita à região da Provença. Localizada no sudeste do país, a área circundada por rios históricos, montanhas nevadas e o Mar Mediterrâneo oferece paisagens que vão de praias de pedra e mar azul cristalino, passando por idílicas paisagens campestres, até o "mar branco" dos Alpes.

Cidades como Avignon, Aix-en-Provence e Cannes abrigam grandes festivais culturais, que recebem anualmente pessoas do mundo inteiro para apreciar espetáculos de teatro, música lírica e mostras cinematográficas. Marselha, a capital da província e cidade portuária, é o segundo maior e mais antigo município do país, sendo assim o centro comercial e industrial, e um dos lugares mais agitados para se visitar na Provença. A região ainda é berço das artes e antigo lar de Cézanne, Renoir, Matisse, Monet e outros grandes precursores do movimento impressionista do século XIX, o que agrega à região uma identidade cultural única.

A gastronomia provençal é conhecida ao redor do mundo pelo "Aioli" e principalmente pelo "Bouillabaisse", caldo à base de frutos do mar recolhidos tradicionalmente do Porto de Marselha. Pequenos e charmosos restaurantes na capital que ofereçam este prato estão presentes em qualquer roteiro gastronômico da região. Extensos vinhedos espalham-se pelo território da Provença, reconhecida por produzir excelentes vinhos rosé.
De clima mediterrâneo em boa parte de seu território, a Provença é banhada de sol o ano inteiro, mesmo que no inverno o frio alpino vigore em cidades mais ao norte, como Nice. As variações climáticas ao longo do território provençal propiciam a prática de esportes diversos, como windsurfing, esqui e passeios de bicicleta pelos campos.

Com suas costas, montanhas, campos, vinhedos e centros urbanos, o tão aclamado "estilo provençal" contempla o bom gosto da cultura rural francesa. Seu charme e elegância se espalham por diversos aspectos da vida dos habitantes locais e, consequentemente, agraciam turistas. O recente investimento em cultura e turismo na região tem atraído os olhares curiosos de todo o mundo, que vêm buscar as peculiaridades e a essência única ao tão conhecido "Sul da França".

Onde ficar

A capital Marselha conta com diversas opções de hotéis luxuosos, B&B e albergues com boa relação custo-benefício. Uma ótima opção é a "Vieille Ville", uma área com prédios históricos e alguns bares badalados para visitas noturnas. Próximo ao bairro ficam a Basilique de Notre Dame de la Gare e o La Table du Fort, restaurante cuja lagosta é a mais famosa da cidade. Em Aix-en-Provence, durante a temporada, alugar uma casa pode ser mais vantajoso, uma vez que muitos estudantes da Universidade da Provença regressam às suas cidades durante as férias. Saint-Tropez é uma cidade pequena, adorada por seus turistas, que vão para curtir paisagens perfeitas e mares cristalinos. A praia preferida de Brigitte Bardot possui pequenas e charmosas pousadas, mas o preço não costuma ser baixo. Em Nice, o Hotel Villa Les Cygnes é um dos mais conhecidos, com diárias de aproximadamente cem euros e localização próxima à praia. Arles, Avignon e Toulon são cidades pequenas e, portanto, a gama de hotéis luxuosos não é grande. Nesse caso, vale procurar albergues e pousadas.

O que comer

Um bom prato de Bouillabaisse num restaurante do bairro de "Le Panier" em Marselha, ou uma "baguete de véspera" com muito Aioli para harmonizar com o aclamado vinho rosé da região, são essenciais numa viagem à Provença. Para quem for até a "Haute Provence", às margens do rio Durance, ao norte, encontrará os "marchés" ao estilo da feira-livre brasileira, com trufas, legumes, azeitonas, frutas e outros alimentos frescos. Produtos da melhor qualidade são vendidos diretamente de seus produtores, que oferecem aos consumidores verdadeiras viagens gastronômicas.

A passagem pelos vinhedos da Provença é crucial aos apreciadores do bom vinho. Em virtude da excelência em produção do tipo rosé, a região já foi eleita um dos dez melhores destinos para degustação de vinhos na Europa. Com exceção de Cassis, especializada na fabricação de vinhos brancos, toda a região, como "Côtes de Provence" e "Coteaux d'Aix-en-Provence", tem foco na produção de rótulos desse tipo. O uso do alho em muitas das receitas típicas locais pede a harmonização com o rosé regional e com os tintos temperados, predominantemente das uvas Mourvedre e Grenache.

O que fazer

Invernos amenos e verões muito quentes caracterizam o clima mediterrâneo da região, cujas paisagens ficam ainda mais bonitas sob o Sol provençal. Porém, não apenas por isso, recomenda-se visitar a Provença no verão, quando os campos de lavanda florescem e são realizados os grandes festivais culturais no Sul da França. O Festival de Cannes contempla a exibição de filmes internacionais e premiações em diversas categorias do cinema. A oeste há o Festival d'Avignon, cuja proposta é prestigiar a arte do teatro. Já o Festival Internacional de Arte Lírica de Aix-en-Provence, todo mês de julho, apresenta espetáculos de ópera e música clássica.

E há muitas opções de esporte. O windsurfing nas praias da Côte d'Azur, a famosa Riviera Francesa, é uma boa pedida aos que buscam se aventurar no Mar Mediterrâneo. Já os que preferem um esporte mais leve "par-terre" devem investir nos passeios de bicicleta pelos campos de lavanda e girassóis ao centro da província. E, é claro, lá estão as melhores e mais conceituadas reservas para esqui do mundo, nos Alpes.
No inverno a viagem não é menos rica. Um passeio pela Promenade des Anglais em Nice, cafés à beira das praias de Saint-Tropez, bares na "Vieille Ville" ou feiras de artesanato em Le Panier, em Marselha, e ruas e mais ruas de lojas de grife em Cannes completam a proposta de comer bem, beber bem e comprar bem durante a viagem.

Bienvenue en Provence!"

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Boa viagem

Desejo-te cada segundo de cheiro novo, de receitas nostálgicas e de novas experiências que passarás a apreciar
Que os odores e os aromas enriqueçam teus dias, mas principalmente tuas noites a passar
Desejo-te os mais enérgicos toques, pra que a ti possam acariciar, mas também calejar
Que sejam ora sutis, ora ardentes, como o clima tropical que deixas pra trás
Desejo-te o mais doce dos sabores, como o do cacau que tanto lhe apraz
Que teu paladar se iguale à vontade de comê-lo em quilos de barras que você sempre traz
Desejo-te a mais avassaladora das visões, pra quando o desconhecido fores explorar
E que as surpresas ocasionem o medo, apenas pra que a todos possas superar
Desejo-te os sons da felicidade e da paz que tanto mereces conquistar
Mas que a essência do teu tom não mude, e que as notas tuas te acompanhem até lá

Desejo-te o mais intenso rol de sensações, e que estas estejam bem acompanhadas
Desejo que tome doses cavalares de sonhos realizados
Desejo, irmão, que tais sonhos recebam as devidas doses de comemoração
Desejo ainda que saibas: sonho este é nada além do primeiro que está por vir
Desejo-te, pois, a mais forte das ânsias pra buscar os outros que ainda virão

Desejo-te uma avalanche de sentimentos, e que encontres aquele algo e aquele alguém que te ajudem a deixá-los escorrer
Desejo-te a distância que tanto me entristece a alma, mas a desejo apenas por saber que a desejas também

Desejo-te ao rosto o mais sincero dos sorrisos
E que, por favor, por obséquio, por gentileza, por mim
Que perca um pouco deste teu tão presente juízo

Por fim, desejo-te tudo que te eleve e que te leve aos sonhos e às vontades
Desejo-te os desejos mais profundos
Desejo-te toda a felicidade
Do mundo

Cheiro de bolo na Mantiqueira

Era manhã fresca de primavera, um domingo qualquer de 1997. Frederica acabara de tirar o bolo do forno e seguira os passos que costumava dar em todas as suas receitas de patisserie: mergulhou um palito de dente em toda a profundidade da massa quente e o retirou com calma, analisando atentamente o que se saía na minúscula superfície de madeira, e confirmou o ponto do doce; delicadamente, com uma pequena peneira cor-de rosa, polvilhou açúcar em toda a cobertura, de forma que cada fatia contivesse tanta doçura quanto aquela do preparo; e cobriu-o carinhosamente com um pano de prato recém-bordado de pequenas flores de lis em diferentes tons de azul.

Na varanda, uma cadeira de fios azuis suportava o generoso peso do marido faminto, ansioso pelo bolo de nozes. Sua única atividade naquele momento era sacar um cigarro uruguaio do maço '007' adquirido no início daquela manhã no camelô da avenida. O pacato movimento de cidadãos pela via de paralelepípedos e o balanço sutil dos galhos da jabuticabeira do outro lado da rua pareciam entretê-lo suficientemente. Nem metade do cigarro ainda tinha fumado e deu logo um último trago fundo, ouvindo a brasa queimar. Cumprimentou um passante com um aceno sutil de cabeça e apagou o '007' no cinzeiro de prata apoiado na mureta ao lado.

Antes que pudesse levantar e levar consigo até a cozinha sua vontade de comer o bolo recém-saído do forno, ouviu motor de carro. Eram pneus conhecidos nos paralelepípedos assustando os passarinhos que cantavam nos fios elétricos. Na frente do portão vazado, o ruído cessou, o carro estacionou, o motor desligou. Um casal de crianças branquinhas desceu serelepe de uma das portas traseiras. Rosana gritava da sacada, no primeiro andar, de felicidade ao ver os sobrinhos. Suzana descia do automóvel pela porta dianteira e abria um sorriso largo. George retribuiu com a pergunta de sempre: "Bom dia. Trouxeram meu gato invisível?"

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Sujeito

Deito em teu peito
E me deleito
Com seus trejeitos
E te lembro teus malfeitos
A despeito
Do desfeito
E suspeito que o afeito
Pelo efeito
Desse amor
Foi refeito
Mas te aceito imperfeito
Não rejeito teus defeitos
E me ajeito em teu leito
Te endireito
Desse jeito
Assim, estreito
Assim, perfeito